segunda-feira, 12 de abril de 2010

Os paladinos da imprensa quase livre. Paladinos??? Livre???

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Colaboração de N. com Y.

A reprise de 2006. Agora, como farsa

por Luiz Carlos Azenha

Em 2005 e 2006 eu era repórter especial da TV Globo. Tinha salário de executivo de multinacional. Trabalhei na cobertura da crise política envolvendo o governo Lula.

Fui a Goiânia, onde investiguei com uma equipe da emissora o caixa dois do PT no pleito local. Obtivemos as provas necessárias e as reportagens foram ao ar no Jornal Nacional. O assunto morreu mais tarde, quando atingiu o Congresso e descobriu-se que as mesmas fontes financiadoras do PT goiano também tinham irrigado os cofres de outros partidos. Ou seja, a “crise” tornou-se inconveniente.

Mais tarde, já em 2006, houve um pequena revolta de profissionais da Globo paulista contra a cobertura política que atacava o PT mas poupava o PSDB. Alguns dos colegas sairam da emissora, outros ficaram. Como resultado de um encontro interno ficou decidido que deixaríamos de fazer uma cobertura seletiva das capas das revistas semanais.

Funciona assim: a Globo escolhe algumas capas para repercutir, mas esconde outras. Curiosamente e coincidentemente, as capas repercutidas trazem ataques ao governo e ao PT. As capas “esquecidas” podem causar embaraço ao PSDB ou ao DEM. Aquela capa da Caros Amigos sobre o filho que Fernando Henrique Cardoso exilou na Europa, por exemplo, jamais atenderia aos critérios de Ali Kamel, que exerce sobre os profissionais da emissora a mesma vigilância que o cardeal Ratzinger dedicava aos “insubordinados”.

Aquela capa da Caros Amigos, como vimos estava factualmente correta. O filho de FHC só foi “assumido” quando ele estava longe do poder. Já a capa da Veja sobre os dólares de Fidel Castro para a campanha de Lula mereceu cobertura no Jornal Nacional de sábado, ainda que a denúncia nunca tenha sido comprovada.

Funciona assim: aos sábados, o Jornal Nacional repercute acriticamente as capas da Veja que trazem denúncias contra o governo Lula e aliados. É o que se chama no meio de “dar pernas” a um assunto, garantir que ele continue repercutindo nos dias seguintes.

Pois bem, no episódio que já narrei aqui no blog eu fui encarregado de fazer uma reportagem sobre as ambulâncias superfaturadas compradas pelo governo quando José Serra era ministro da Saúde no governo FHC. Havia, em todo o texto, um número embaraçoso para Serra, que concorria ao governo paulista: a maioria das ambulâncias superfaturadas foi comprada quando ele era ministro.

Ainda assim, os chefes da Globo paulista garantiram que a reportagem iria ao ar. Sábado, nada. Segunda, nada. Aparentemente, alguém no Rio decidiu engavetar o assunto. E é essa a base do que tenho denunciado continuamente neste blog: alguns escândalos valem mais que outros, algumas denúncias valem mais que outras, os recursos humanos e técnicos da emissora — vastos, aliás — acabam mobilizados em defesa de certos interesses e para atacar outros.

Nesta campanha eleitoral já tem sido assim: a seletividade nas capas repercutidas foi retomada recentemente, quando a revista Veja fez denúncias contra o tesoureiro do PT. Um colega, ex-Globo, me encontrou e disse: “A fórmula é a mesma. Parece reprise”.

Ou seja, podemos esperar mais do mesmo:

– Sob o argumento de que a emissora está concedendo “tempo igual aos candidatos”, se esconde uma armadilha, no conteúdo do que é dito ou no assunto que é escolhido. Frequentemente, em 2006, era assim: repercutindo um assunto determinado pela chefia, a Globo ouvia três candidatos atacando o governo (Geraldo Alckmin, Heloisa Helena e Cristovam Buarque) e Lula ou um assessor defendendo. Ou seja, era um minuto e meio de ataques e 50 segundos de contraditório.

– O Bom Dia Brasil é reservado a tentar definir a agenda do dia, com ampla liberdade aos comentaristas para trazer à tona assuntos que em tese favoreçam um candidato em detrimento de outro.

– O Jornal da Globo se volta para alimentar a tropa, recorrendo a um grupo de “especialistas” cuja origem torna os comentários previsíveis.

– Mensagens políticas invadem os programas de entretenimento, como quando Alexandre Garcia foi para o sofá de Ana Maria Braga ou convidados aos quais a emissora paga favores acabam “entrevistados” no programa do Jô.

A diferença é que, graças a ex-profissionais da Globo como Rodrigo Vianna, Marco Aurélio Mello e outros, hoje milhares de telespectadores e internautas se tornaram fiscais dos métodos que Ali Kamel implantou no jornalismo da emissora. Ele acha que consegue enganar alguém ao distorcer, deturpar e omitir.

É mais do mesmo, com um gostinho de repeteco no ar. A história se repete, agora com gostinho de farsa.

Querem tirar a prova? Busquem no site do Jornal Nacional daquele período quantas capas da Veja ou da Época foram repercutidas no sábado. Copiem as capas das revistas que foram repercutidas. Confiram o conteúdo das capas e das denúncias. Depois, me digam o que vocês encontraram.


COMENTÁRIOS DO JORNALISTA N.G.

1-) "Alguns dos colegas sairam da emissora, outros ficaram" - Exato. Ele foi dos que ficaram. Optou pela grana. Um direito incontestável.

2-) "capas das revistas semanais" - Olha bem a manipulação. "Caros Amigos" não uma revista semanal de notícias, e sim uma revista mensal de interpretação. Como Piauí (do outro lado) nunca foi repercutida pela Globo.

3-) "Aquela capa da Caros Amigos, como vimos estava factualmente correta." - Perfeito. Estava mesmo. Mas, recordemos, "Caros Amigos" NUNCA pautou a Globo, e, neste caso, o problema ia além do filho ser do presidente. Era pior, porque era também de uma funcionária da própria Globo. Não foi só a empresa que "amorcegou", foram os colegas de todos os partidos, numa atitude corporativista, por um lado, mas que leva a uma questão: se a revelação fda filha escondida de Lula foi tão criticada, por que os mesmos que fizeram a crítica exigiam, então, a revelação do filho escondido de FHC? Vingança? Ou o que vale para uns vão vale para outros?

4-) "alguns escândalos valem mais que outros, algumas denúncias valem mais que outras, os recursos humanos e técnicos da emissora — vastos, aliás — acabam mobilizados em defesa de certos interesses e para atacar outros." - Bem, cada empresa usa o que tem. "Caros Amigos", por exemplo, faz exatamente o mesmo, só que numa escala muito menor, porque tem muito menos recursos. Esta é uma questão de fundo no jornalismo brasileiro, que, como não canso de repetir, é todo tendencioso e alinhado a um lado. Por isso, insisto, não se pode ser sectário e acreditar apenas nos que nos são simpáticos. A gente precisa ler tudo, ouvir todos e assistir a todos, para tentar formar uma opinião própria imparcial.

Ou acreditas que o Blog do Azenha, um excelente repórter, é imparcial?

Vai ver por conta própria (ouvindo a todas as versões) porque depois de participar de tantas trampolinagens da Globo, ele um dia amanheceu fora e se tornou um crítico ácido dos antigos patrões a quem não se importava de servir.

Ah!

Ali Kamel tem mesmo fama de gangster da corrupção informativa. Mas não é de duvidar que um dia saia da Globo e se torne um paladino da imprensa livre. Não será o primeiro nem o último.

A merda é que nesta enxurrada de denúncias de todos os lados, os ingênuos se distraem e não percebem que o verdadeiro problema é que todos agem da mesma forma, que só varia, a forma, da circunstância de estarem no poder ou na oposição. Isto é que deveria ser o centro do debate. Mas fica estratégicamente esquecido...

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